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Discurso de Allan Kardec proferido na Sociedade Espírita de Paris. Parte I

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1200px Photo KardecSOCIEDADE PARISIENSE DE ESTUDOS ESPÍRITAS

Discurso de encerramento do ano social (1858-1859) – Parte I

Allan Kardec

 

“O conjunto de raciocínios sobre os quais se apoiam os fatos constitui a ciência, ciência ainda imperfeita, é certo, cujo apogeu ninguém pretende ter atingido; mas, enfim, é uma ciência em início e vossos estudos se dirigem para a pesquisa de tudo quanto pode alargá-la e constituí-la.”

 

 

No momento em que expira o vosso ano social, permiti que vos apresente um curto resumo da marcha e dos trabalhos da Sociedade.

Conheceis a sua origem. Ela se formou sem um desígnio premeditado, sem um projeto preconcebido. Alguns amigos se reuniam em minha casa num pequeno grupo; pouco a pouco esses amigos me pediram permissão para me apresentar seus amigos. Então não havia um presidente: eram saraus íntimos, de oito ou dez pessoas, como os há às centenas, em Paris e alhures. Era natural, entretanto, que em minha casa eu tivesse a direção do que ali se fazia, já como dono, já em consequência dos estudos especiais que havia feito e que me davam certa experiência na matéria.

O interesse despertado por essas reuniões foi crescendo, embora não nos ocupássemos senão de coisas muito sérias. Pouco a pouco, um a um foi crescendo o número dos assistentes e meu modesto salão, muito pouco adequado para uma assembleia, tornou-se insuficiente. Foi então que alguns de entre vós propuseram se procurasse outro mais cômodo e que nos cotizássemos a fim de cobrir as despesas, pois não achavam justo que tudo corresse por minha conta, como até então.

Mas para nos reunirmos regularmente, além de um certo número e num local diferente, era necessário nos conformássemos às exigências legais, ter um regulamento e, consequentemente, um presidente titulado. Enfim, era necessário constituir-se uma sociedade. Foi o que aconteceu, com o assentimento da autoridade, cuja benevolência não nos faltou. Era também necessário imprimir aos trabalhos uma direção metódica e uniforme, e houvestes por bem encarregar-me de continuar aquilo que fazia em casa, nas nossas reuniões particulares.

Dei às minhas funções, que posso chamar de laboriosas, toda a exatidão e todo o devotamento de que fui capaz. Do ponto de vista administrativo, esforcei-me por manter nas sessões uma ordem rigorosa e por lhes dar um caráter de seriedade, sem o qual logo teria desaparecido o prestígio de assembleia séria. Agora, que minha tarefa está terminada e que o impulso foi dado, devo comunicar-vos a resolução, que tomei de renunciar, para o futuro, a qualquer função na Sociedade, mesmo a de diretor de estudos. Não ambiciono nenhum título, a não ser o de simples membro titular, com o qual me sentirei sempre feliz e honrado. O motivo de minha determinação está na multiplicidade de meus trabalhos, que aumentam dia a dia, pela extensão de minhas relações, porque, além daquilo que conheceis, preparo outros trabalhos mais consideráveis, que exigem longos e laboriosos estudos e que não absorverão menos de dez anos. Ora, os trabalhos da Sociedade não deixam de tomar muito tempo, quer na preparação, quer na coordenação e redação final. Além disso, reclamam uma assiduidade por vêzes prejudicial às minhas ocupações pessoais e tornam indispensável a iniciativa quase exclusiva que me conferistes. É por este motivo, senhores, que tantas vezes tive de tomar a palavra, muitas delas lamentando que membros eminentes e esclarecidos nos privassem de suas luzes. Há muito tempo eu desejava demitir-me de minhas funções; em várias circunstâncias o externei de maneira explícita, tanto aqui, quanto par­ticularmente, a diversos colegas, notadamente ao Sr. Ledoyen. Tê-lo-ia feito mais cedo, sem receio de causar perturbação na Sociedade, retirando-me ao meio do ano, mas poderia parecer uma defecção. E era necessário não dar esse prazer aos nossos adversários. Tive, pois, que cumprir a minha tarefa até o fim. Hoje, porém, que não mais existem estes motivos, apresso-me em vos comunicar a minha resolução, a fim de não entravar a escolha que deveis fazer. É justo que cada um participe dos encargos e das honras.

Há um ano a Sociedade viu sua importância crescer rapidamente. O número de seus membros titulares triplicou em alguns meses; tendes numerosos correspondentes nos dois conti­nentes e os ouvintes ultrapassariam o limite do possível, se não puséssemos um freio pela estrita execução do regulamento. En­tre os últimos contastes as mais altas notabilidades sociais e fi­guras das mais ilustradas. A pressa que há em solicitar admissão às vossas sessões demonstra o interesse que elas despertam, não obstante a ausência de qualquer experimentação destinada a satisfazer a curiosidade e, talvez, em virtude mesmo da sua simplicidade. Se nem todos saem convencidos, o que seria pre­tender o impossível, as pessoas sérias, as que não vêm com a idéia preconcebida de denegrir, levam da seriedade dos vossos trabalhos uma impressão que as predispõe a aprofundar essas questões. Aliás, não podemos senão aplaudir essas restrições feitas à admissão de ouvintes estranhos: assim evitamos uma multidão de curiosos importunos. À medida que limitou esta admissão a certas sessões, reservando as outras exclusivamente aos membros da sociedade, teve como resultado vos dar mais liberdade nos estudos, que poderiam ser entravados pela presença de pessoas ainda não iniciadas e cuja simpatia não estivesse garantida.

Essas restrições parecerão muito naturais aos que conhecem a finalidade de nossa instituição e sabem que somos, antes de tudo, uma Sociedade de estudo e de pesquisas e não um veículo de propaganda. É por isto que não admitimos em nossas fileiras aqueles que, não possuindo as primeiras noções da ciência, nos fariam perder tempo em demonstrações elementares, incessan­temente renovadas. Sem dúvida todos nós desejamos a propa­ganda das idéias que professamos, porque as julgamos úteis e cada um de nós para isso contribui. Sabemos, porém, que só se adquire convicção em observações seguidas e nunca pelos fatos isolados, sem continuidade e sem raciocínio, contra os quais a incredulidade sempre poderá levantar objeções. Dir-se-á que um fato é sempre um fato; é um argumento irretorquível; sem dúvida, desde que nem seja contestado nem contestável. Quando um fato sai do círculo de nossas idéias e de nossos conhecimentos, a primeira vista parece impossível; quanto mais extraordinário, mais objeção levanta. Eis porque o contestam.

Aquele que lhe sonda a causa e a descobre, encontra-lhe uma base e uma razão de ser; compreende a sua possibilidade e desde então não mais o rejeita. Muitas vezes um fato só é inteligível por sua ligação com outros fatos. Tomado isola­damente pode parecer estranho, incrível e até absurdo. Mas se for um dos elos da cadeia, se tiver uma base racional, se se puder explicá-lo, desaparecerá qualquer anomalia.

Ora, para conceber esse encadeamento, para apreender esse conjunto a que somos conduzidos de consequência em consequência, é necessário, em todas as coisas — e talvez ainda mais no Espiritismo — uma série de observações racionais. O raciocínio é, pois, poderoso elemento de convicção, hoje mais do que nunca, porque as idéias positivas nos levam a saber o porquê e o como de cada coisa.

Admiramo-nos da persistência da incredulidade em matéria de Espiritismo, por parte de pessoas que viram, enquanto outras que nada viram são crentes firmes. Dir-se-ia que estas são superficiais e aceitam sem exame tudo quanto se lhes diz? Muito ao contrário. As primeiras viram, mas não compreen­dem; as últimas não viram, mas compreendem; e compreendem porque raciocinam.

O conjunto de raciocínios sobre os quais se apoiam os fatos constitui a ciência, ciência ainda imperfeita, é certo, cujo apogeu ninguém pretende ter atingido; mas, enfim, é uma ciência em início e vossos estudos se dirigem para a pesquisa de tudo quanto pode alargá-la e constituí-la.

Eis o que importa seja bem sabido fora deste recinto, a fim de que não haja equívocos quanto aos nossos objetivos; a fim de que, ao virem aqui, não esperem vir a um espetáculo dado pelos Espíritos. A curiosidade tem um limite. Quando satis­feita, procura uma nova distração. Aquele que não para na superfície, que vê além do efeito material, sempre acha o que aprender: para ele o raciocínio é uma fonte inesgotável; não tem limites. Nossa linha de conduta não poderia ser melhor traçada do que pelas admiráveis palavras que o Espírito de São Luís nos dirigiu, e que jamais deveríamos esquecer: “Zom­baram das mesas girantes, mas não zombarão jamais da filo­sofia, da sabedoria, da caridade que brilham nas comunicações sérias. Que vejam aqui, que escutem ali, mas que no vosso meio compreendam e tenham amor”.

A expressão "que no vosso meio compreendam" é todo um ensinamento. Devemos compreender, e procuramos compreender, porque não queremos crer como cegos: o raciocínio é o facho que nos guia. Mas o raciocínio de um só pode transviar-se; eis porque nos quisemos reunir em sociedade, a fim de nos escla­recermos mutuamente pelo concurso recíproco de nossas idéias e observações. Colocados neste terreno, assemelhamo-nos a todas as demais instituições científicas, e nossos trabalhos produzi­rão mais prosélitos sérios do que se passássemos o tempo a fazer que as mesas se movam e deem pancadas. Em breve estaríamos fartos disso. Nosso pensamento requer um alimento mais sólido e, por isso, buscamos penetrar os mistérios do mundo invisível, cujos primeiros indícios são esses fenômenos elementares.

Os que sabem ler se divertem a repetir sem cessar o alfabeto? Talvez tivéssemos maior afluência de curiosos, sucedendo-se em nossas sessões como personagens de um panorama mutável. Mas esses curiosos, que não poderiam improvisar uma convicção por verem um fenômeno para eles inexplicável, que julgariam sem aprofundar, seriam antes um obstáculo aos nossos trabalhos. Eis porque, não querendo desviar-nos do nosso ca­ráter científico, afastamos todos quantos não sejam atraídos por um fim sério.

O Espiritismo tem consequências de tal gravidade, toca em questões de tal alcance, dá a chave de tantos problemas, oferece-nos, enfim, tão profundo ensino filosófico, que ao lado de tudo isso uma mesa girante é pura infantilidade.

A observação dos fatos, sem o raciocínio, dizíamos nós, é insuficiente para dar completa convicção. Poderíamos taxar de leviano aquele que se declarasse convencido por um fato que não tivesse compreendido. Esta maneira de proceder, entretan­to, tem outro inconveniente que deve ser assinalado e do qual cada um de nós pode dar testemunho: é a mania de experimen­tação, como consequência natural.

Aquele que vê um fato espírita, sem lhe haver estudado todas as circunstâncias, geralmente não vê mais que o fato material. Então o julga do ponto de vista de suas próprias idéias, sem pensar que, fora das leis comuns, pode e deve haver leis desconhecidas. Julga poder manobrá-lo à sua vonta­de: impõe condições e não se convencerá, conforme diz, se o fato não se repetir de uma certa maneira, e não de outra. Ima­gina que se fazem experiências com os Espíritos como se fossem uma pilha elétrica; não conhecendo sua natureza, nem sua maneira de ser, pois não as estudou, pensa que lhes pode impor a sua vontade. E imagina que eles devem agir a um simples sinal, pelo simples prazer de convencê-lo. Porque se dispõe a ouvi-los durante quinze minutos, supõe que devam ficar às suas ordens.

São erros em que não caem aqueles que se dão ao trabalho de aprofundar os estudos. Conhecem os obstáculos e não pedem o impossível. Em lugar de quererem convencer do seu ponto de vista os Espíritos, coisa a que estes não se submetem voluntariamente, colocam-se no ponto de vista dos Espíritos, com o que os fenômenos mudam de aspecto. Para isto são necessárias paciência, perseverança e firme vontade, sem o que nada se alcança.

Aquele que realmente quer saber deve submeter-se às con­dições da coisa em si, e não querer que esta se submeta às suas condições.

Por isto a Sociedade não se presta a experimentações que não dariam resultado, pois sabe, por experiência, que o Espiritismo, como qualquer outra ciência, não se aprende de um jacto e em poucas horas. Como uma sociedade séria, não quer tratar senão com gente séria, que compreende as obrigações impostas por um tal estudo, desde que se queira fazê-lo conscienciosamente. Ela não reconhece como sérios os que dizem: Deixem-me ver um fato e eu me convencerei.

Significa isto que desprezamos os fatos?

Muito ao contrário, pois toda a nossa ciência está baseada nos fatos. Pesquisamos com interêsse todos aqueles que nos oferecem matéria de estudo ou confirmam princípios admitidos. Quero apenas dizer que não perdemos tempo em reproduzir os fatos que já conhecemos, do mesmo modo que um físico não se diverte em repetir incessantemente as experiências que nada de novo lhe ensinam.          Dirigimos nossa investigação a tudo quanto possa esclarecer a nossa marcha, preferindo as comunicações inteligentes, fonte da filosofia espírita e cujo campo ilimitado é muito mais vasto que o das manifestações puramente materiais, de interesse apenas momentâneo.

Dois sistemas igualmente preconizados e praticados se apre­sentam na maneira de receber as comunicações de além-túmulo: uns preferem esperar as comunicações espontâneas; outros as provocam por um apelo direto a este ou àquele Espírito. Pre­tendem os primeiros que na ausência de controle para estabelecer a identidade dos Espíritos, esperando a sua boa vontade ficamos menos expostos a ser induzidos em erro; desde que o Espírito fala é porque está presente e quer falar, ao passo que não temos certeza de que aquele que chamamos possa vir e responder. Os outros objetam que deixar falar o primeiro que apareça é abrir a porta a bons e maus. A incerteza da identi­dade não é objeção séria, pois muitas vezes dispomos do meio de a constatar, sendo aliás a constatação objeto de um estudo ligado aos mesmos princípios da ciência. O Espírito que fala espontâneamente limita-se quase sempre às generalidades, enquanto as perguntas lhe traçam um quadro mais positivo e mais instrutivo.

Quanto a nós, apenas condenamos a exclusividade de siste­mas. Sabemos que ótimas coisas são obtidas de um e de outro modo. E se preferimos o segundo, é que a experiência nos ensina que nas comunicações espontâneas os Espíritos mistificadores não deixam de enfeitar-se com nomes respeitáveis, tanto quanto nas evocações. Tem mesmo o campo mais livre, ao passo que com as perguntas nós os dominamos muito mais facilmente, sem contar que as questões têm incontestável utilidade nos estudos. É a esta maneira de investigar que devemos a quantidade de observações recolhidas diariamente e que nos permitem pene­trar mais profundamente nesses extraordinários mistérios. Quan­to mais avançamos, mais se nos alarga o horizonte, mostrando quanto é vasto o campo que devemos ceifar.

As numerosas evocações que temos feito permitiram lançás­semos o olhar investigador sobre o mundo invisível, de um a outro extremo, isto é, tanto naquilo que há de mais ínfimo, quanto no que há de mais sublime. A incontável variedade de fatos e de caracteres brotados desses estudos, realizados com calma profunda, com atenção contínua e com circunspecção prudente de observadores sérios, abriu-nos os arcanos desse mundo para nós tão novo.

A ordem e o método aplicado em vossas pesquisas eram indispensáveis elementos de sucesso.

Com efeito, sabeis por experiência que não basta chamar, ao acaso, o Espírito desta ou daquela pessoa. Os Espíritos não vêm assim, a nossa vontade ou capricho e não respondem a tudo quanto a fantasia nos leva a lhes perguntar. Com os seres de além-túmulo são necessárias habilidade e uma lingua­gem adequada à sua natureza, às suas qualidades morais, a seu grau de inteligência, à posição que ocupam. Com eles, e se­gundo as circunstâncias, devemos ser dominadores ou submissos, compassivos com os que sofrem, humildes e respeitosos com os superiores, firmes com os maus e com os teimosos, que só dominam aqueles que os escutam complacentemente. Enfim, é necessário saber formular e encadear metodicamente as pergun­tas, para que se obtenham respostas mais explícitas, captar nas respostas as nuanças que, por vezes, constituem traços caracte­rísticos, revelações importantes e que escapam ao observador superficial, inexperiente ou ocasional.

A maneira de conversar com os Espíritos é, pois, uma ver­dadeira arte, que exige tato, conhecimento do terreno que pi­samos e constitui, a bem dizer, o Espiritismo prático. Conve­nientemente dirigidas, as evocações podem ensinar muito. Elas oferecem um poderoso elemento de interesse, de moralidade e de convicção. De interesse porque nos dão a conhecer o estado do mundo que a todos espera, do qual por vezes fazemos uma ideia extravagante; de moralidade porque nelas podemos ver, por analogia, a nossa sorte futura; de convicção, porque temos nessas conversas íntimas a prova manifesta da existência e da indi­vidualidade dos Espíritos, que outra coisa não são do que as nossas próprias almas, desprendidas da matéria terrena.

Estando, em geral, formada a vossa opinião sobre o Espi­ritismo, não tendes necessidade de assentar as vossas convicções na prova material das manifestações físicas. Por outro lado, aconselhados pelos Espíritos, quisestes limitar-vos ao estudo dos princípios e dos problemas morais, sem que, por isso, ficasse desprezado o exame dos fenômenos que podem auxiliar a pes­quisa da verdade.

A crítica sistemática censurou-nos por aceitarmos muito facilmente as doutrinas de certos Espíritos, sobretudo no que concerne às questões científicas. Essas pessoas mostram, por isso mesmo, que nem conhecem o verdadeiro escopo da Ciência Espírita, nem aquele a que nos propomos, com o que nos dão o direito de lhes devolver a censura de leviandade de julgamento.

Certamente não será a vós que pode ser ensinada a reserva com que deve ser acolhido aquilo que vem dos Espíritos. Esta­mos longe de aceitar tudo quanto eles dizem como artigos de fé. Sabemos que há entre eles todas as nuanças de saber e de moralidade. Para nós são toda uma população, que apre­senta variedades com vezes mais numerosas que as que perce­bemos entre os homens. O que queremos é estudar essa popu­lação; é chegar a conhecê-la e compreendê-la.

Para tanto, estudamos as individualidades, observamos as diferenças sutis, procuramos aprender os traços distintivos de seus costumes, de seus hábitos, de seu caráter. Queremos, final­mente, identificar-nos, tanto quanto possível, com o estado desse mundo. Antes de ocupar uma habitação gostamos de saber como é ela; se ali estaremos confortavelmente; queremos conhecer os hábitos dos vizinhos, o tipo de sociedade que poderemos frequentar. Pois então! É a nossa morada futura, são os costumes da gente em cujo meio iremos viver que os Espíritos nos dão a conhecer.

Mas, assim como entre nós há pessoas ignorantes e de vistas curtas, que fazem uma idéia incompleta do nosso mundo mate­rial e do meio que lhes seja estranho, também os Espíritos de horizonte moral limitado não podem apreender o conjunto e ainda se acham sob o império dos preconceitos e dos sistemas. Não podem, portanto, instruir-nos sobre tudo quanto se relaciona com o mundo espírita, do mesmo modo que um camponês não o poderia fazer em relação a alta sociedade parisiense ou ao mundo da Ciência. Seria, pois, fazer um triste juízo do nosso raciocínio pensar que ouvimos a todos os Espíritos como se fôssem oráculos.

Os Espíritos são o que são e nós não podemos alterar a ordem das coisas. Como nem todos são perfeitos, não aceita­mos suas palavras senão com reservas e jamais com a creduli­dade das crianças. Julgamos, comparamos, tiramos conclusões do que observamos e os seus próprios erros constituem ensinamentos para nós, uma vez que não renunciamos ao nosso discernimento.


 

Fonte: Kardec, A. Revista Espírita, Ano 1859, Edicel, p. 187-195.

“Todo efeito tem uma causa. Todo efeito inteligente tem uma causa inteligente. O poder da causa inteligente está na razão

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Allan Kardec

Nasceu em Lyon, França em 1804. Professor, escritor e autor da codificação espírita, desencarnou em 1869.