Off Canvas sidebar is empty
Primeiro grupo espírita da internet

Correspondência Inédita de Lavater com a Imperatriz Maria da Rússia (Quarta Carta)

COMPARTILHE!

lavaterjc

Em minha carta precedente, mui venerada Imperatriz, prometi vos enviar a carta de um defunto a seu amigo da Terra. Ela poderá melhor vos fazer compreender e captar minhas ideias sobre o estado de um cristão após a morte de seu corpo. Tomo a liberdade de juntá-la a esta. Julgai-a do ponto de vista que vos indiquei, e tende a bondade de prestar mais atenção para o assunto principal do que para alguns detalhes particulares que o cercam, embora eu tenha razões para supor que estes últimos também encerrem alguma coisa de verdadeiro.

Para a compreensão das matérias que vos exporei na continuação, sob esta forma, creio necessário vos fazer notar que tenho quase certeza que, malgrado a existência de uma lei geral, idêntica e imutável, de castigo e de felicidade suprema, cada Espírito, segundo o seu caráter individual, não somente moral e religioso, mas mesmo pessoal e oficial, terá sofrimentos a suportar após a sua morte terrestre e gozará de felicidades que serão apropriadas exclusivamente a ele. A lei geral individualizar-se-á para cada indivíduo em particular, isto é, ela produzirá em cada um, um efeito diferente e pessoal, exatamente como o mesmo raio de luz, atravessando um vidro colorido, convexo ou côncavo, dele tira, em parte, a sua cor e a sua direção. Eu queria, pois, que ele fosse aceito positivamente: que, embora todos os Espíritos bem-aventurados, menos felizes ou sofredores, se encontrem sob a mesma lei muito simples de semelhança ou dessemelhança com o mais perfeito amor, deve-se presumir que o caráter substancial, pessoal, individual de cada Espírito constitua um estado de sofrimento ou de felicidade essencialmente diferente do estado de sofrimento ou de felicidade de outro Espírito. Cada um sofre de uma maneira que difere do sofrimento de outro, e sente prazeres que um outro não seria capaz de sentir. A cada um dos mundos, material e imaterial, Deus e o Cristo se apresentam sob uma forma particular, sob a qual não aparecem a ninguém, senão a ele. Cada um tem seu ponto de vista que não pertence senão a si próprio. A cada Espírito, Deus fala uma língua só por ele compreensível. Com cada um ele se comunica em particular e lhe concede prazeres que só ele está em estado de experimentar e conter.

Esta ideia, que considero uma verdade, serve de base a todas as comunicações seguintes, dadas por Espíritos desencarnados aos seus amigos da Terra.

Sentir-me-ei feliz ao saber que compreendestes como cada homem, pela formação de seu caráter individual e pelo aperfeiçoamento de sua individualidade, pode preparar para si mesmo prazeres particulares e uma felicidade adequada a si só.

Como nada esquecemos tão depressa e nada é menos procurado pelos homens do que essa felicidade apropriada a cada indivíduo, embora cada um tenha toda a possibilidade de proporcioná-la a si próprio e dela desfrutar, tomo a liberdade, sábia e venerada Imperatriz, de vos rogar com instância vos digneis analisar com atenção esta ideia que certamente não podeis olhar como inútil para a vossa própria edificação e vossa elevação para Deus: O próprio Deus colocou-se e colocou o Universo no coração de cada homem.

Todo homem é um espelho particular do Universo e de seu Criador. Façamos, pois, todos os nossos esforços, mui venerada Imperatriz, para manter esse espelho tão puro quanto possível, para que Deus possa aí se ver a si mesmo e a sua mil vezes bela criação, refletidos para sua satisfação.

JEAN-GASPAR LAVATER.

Zurique, 14 de setembro de 1798.

CARTA DE UM DEFUNTO A SEU AMIGO NA TERRA

Sobre o estado dos Espíritos desencarnados

Enfim, meu bem-amado, me é possível satisfazer, embora apenas em parte, o meu e o teu desejo de informar-te alguma coisa acerca do meu estado atual. Desta vez não te posso dar senão pouquíssimos detalhes. No futuro, tudo dependerá do uso que fizeres de minhas comunicações.

Sei que o desejo que experimentas de ter noções sobre mim, como em geral sobre o estado de todos os Espíritos desencarnados, é muito grande, mas não ultrapassa o meu de te ensinar o que é possível revelar. O poder de amar daquele que amou no mundo material, aumenta inexprimivelmente quando ele se torna cidadão do mundo imaterial. Com o amor também aumenta o desejo de informar àqueles que ele conheceu, aquilo que ele pode, o que lhe é permitido transmitir.

Devo começar por explicar-te, meu bem-amado, a ti que amo a cada dia mais, por qual meio me é possível escrever-te, sem poder, ao mesmo tempo, tocar o papel e conduzir a pena, e como te posso falar numa língua inteiramente terrestre e humana que em meu estado habitual eu não compreendo.

Esta indicação deve servir-te apenas de traço de luz, para poderes compreender como deves encarar o nosso estado presente.

Imagina meu estado atual diferente do precedente, mais ou menos como o estado da borboleta voejando no ar difere de seu estado de crisálida. Eu sou justamente essa crisálida transfigurada e emancipada, já tendo sofrido duas metamorfoses. Exatamente como a borboleta volita em redor das flores, nós voejamos muitas vezes em torno da cabeça dos bons, mas não sempre. Uma luz invisível para vós, mortais, ou pelo menos visível apenas para bem poucos dentre vós, irradia ou brilha docemente ao redor da cabeça de todo homem bom, amante e religioso. A ideia da auréola com a qual cercam a cabeça dos santos, é essencialmente verdadeira e racional. Levando-se em conta que todo ser bem-aventurado só o é pela luz, quando essa luz se compatibiliza com a nossa, ela o atrai para si, conforme o grau de sua claridade compatível com a nossa. Nenhum Espírito impuro ousa e pode aproximar-se dessa santa luz. Fixando-nos nessa luz, acima da cabeça do homem bom e piedoso, podemos ler incontinenti em seu espírito. Vemo-lo tal qual ele é em realidade. Cada raio que dele sai é para nós uma palavra, por vezes todo um discurso; respondemos aos seus pensamentos. Ele ignora que somos nós que respondemos. Nele excitamos ideias que, sem a nossa ação, ele jamais teria estado em condições de conceber, embora a disposição e a aptidão para rece­bê-las sejam inatas em sua alma.

O homem digno de receber a luz torna-se, assim, um órgão útil e muito proveitoso para o Espírito simpático que deseja transmitir-lhe as suas luzes.

Encontrei um Espírito, ou melhor, um homem acessível à luz, do qual pude aproximar-me, e é por seu órgão que te falo. Sem sua intermediação ter-me-ia sido impossível comunicar-me contigo humanamente, verbalmente, palpavelmente, numa palavra, escrever-te.

Desta maneira, pois, recebes uma carta anônima da parte de um homem que não conheces, mas que nutre em si uma forte tendência para as matérias ocultas e espirituais. Eu plano acima dele; posto-me sobre ele, mais ou menos como o mais divino de todos os Espíritos se postou sobre o mais divino de todos os homens, após o seu batismo; suscito-lhe ideias; ele as transcreve sob a minha intuição, sob a minha direção, por efeito da minha radiação. Por um leve toque, faço vibrarem as cordas de sua alma de maneira conforme à sua individualidade e à minha. Ele escreve o que desejo fazê-lo escrever; escrevo por seu intermédio; minhas ideias tornam-se as suas. Ele se sente feliz escrevendo. Torna-se mais livre, mais animado, mais rico em ideias. Parece-lhe que vive e plana num elemento mais alegre, mais claro. Ele anda devagar, como um amigo que conduz um amigo pela mão, e é desta maneira que de mim recebes uma carta. Aquele que escreve supõe-se livre e o é muito realmente.

Ele não sofre nenhuma violência; é livre como o são dois amigos que, andando de braço dado, entretanto se conduzem reciprocamente.

Tu deves sentir que meu Espírito se acha em relação direta com o teu; concebes o que te digo; entendes os meus mais íntimos pensamentos.

É bastante por esta vez. O dia em que ditei esta carta chama-se, entre vós, 15 de setembro de 1798.


Fonte: Revista Espírita, Ano XI, V. 4, abril de 1868

 

Allan Kardec's Avatar

Allan Kardec

Nasceu em Lyon, França em 1804. Professor, escritor e autor da codificação espírita, desencarnou em 1869.