Boletim GEAE

Grupo de Estudos Avançados Espíritas

http://www.geae.inf.br

Fundado em 15 de outubro de 1992
Boletim Quinzenal de Distribuição Eletrônica

"Fé inabalável é somente aquela que pode encarar a razão, face a face, em todas as épocas da humanidade", Allan Kardec

Ano 12 - Número 482 - 2004            28 de setembro de 2004

Editorial

A Caminho da Luz

Artigos

Um Diálogo Fraterno sobre a Ciência & Espiritismo VII

História & Pesquisa

A Pesquisa Qualitativa entre a Fenomenologia e o Espiritismo-Formal III, Jáder dos Reis Sampaio, Brasil


Questões e Comentários

Questões Intrincadas sobre o Espiritismo V

Painel

Relato do III ENLIHPE, Jader Sampaio, Brasil
IV Congresso Espírita Mundial ao vivo pela Internet, Luis Hu Rivas, Brasil


Editorial


A Caminho da Luz

    • "O determinismo do amor e do bem é a lei de todo o Universo e a alma humana emerge de todas as catástrofes em busca de uma vida melhor" -  Emmanuel, médium Francisco Cândido Xavier, A Caminho da Luz, FEB

O ponto inicial da humanidade se perde na noite dos tempos, nas eras remotas da pré-historia quando os primeiros primatas deixaram o habitat seguro das árvores em troca do caminhar bípede. Caminhar que os levou aos mais diferentes pontos da terra e através dos milênios lhes proporcionou a capacidade de usar os braços no manejo de ferramentas cada vez mais sofisticadas.

Neste lento caminho de evolução, dos quais os registros arqueológicos nos dão o testemunho, o despertar da espiritualidade pode ser datado das primeiras manifestações de pensamento abstrato. Destas primeiras manifestações restam as figuras esculpidas da idade da pedra e as pinturas em cavernas que hoje assombram os visitantes em Lacaux e Altamira entre outras.

E com o despertar da espiritualidade vieram as cerimônias funebres, características do homem moderno com certeza absoluta e do homem de neanderthal com grande possibilidade. Estas cerimônias começaram com a disposição dos cadáveres em um local especial e aos poucos ganharam complementos, como adereços e objetos adicionados ao local do enterro, desenvolvendo-se finalmente até os megalitos e dolmens das civilizações esquecidas dos últimos milênios antes da escrita.

Quando surge a escrita, são civilizações já em pleno desenvolvimento que se apresentam aos olhos do historiador, com um pensamento religioso bastante complexo. Por exemplo, na Mesopotâmia e no Egito, que são as que temos melhores testemunhos. Outro exemplo, do qual nos restaram imponentes ruínas e tradições orais antiquíssimas, é a civilização do Vale do Indo.

Seguindo-se o desenvolvimento destas civilizações primitivas se encontram os primórdios do monoteismo entre os semitas, as doutrinas esotéricas no Egito Antigo e a extraordinária filosofia dos Vedas na India.

E a adolescência da humanidade começa a se formar a partir do segundo milênio antes de Cristo. Talvez seu inicio possa ser datado do reinado de Akhenaton, o faraó que passou a história por trazer a primeira grande revolução religiosa de que se tem notícia, ao buscar estabelecer o culto de um Deus único em uma civilização politeista. Talvez, poucos séculos depois, no momento em que Moisés apresentou ao povo de Israel as tábuas com as leis de Deus, que consagraram o "Não Matarás" como um dos principais deveres morais da humanidade.

Outro momento que poderia talvez datar a idade em que a humanidade sai de sua infância é a iluminação de Sidharta Gautama, que após uma sacrificada busca encontrou a solução para o problema do sofrimento humano. Solução que se baseia na compreensão da transformação permanente do universo e na necessidade de uma conduta ética sólida. Conduta cuja base é a compaixão por todos os seres sencientes - que sentem e sofrem - e o respeito profundo por todas as formas de vida.

Mas se nenhum destes momentos for escolhido há um outro, que com certeza absoluta, fecha este período de transição. É o instante em que um homem de origens humildes, de um pequeno vilarejo tão pobre que praticamente não deixou restos para a posteridade e que nem aparece nas listas de cidades de seu tempo, diante da multidão de famintos e desfavorecidos da sorte proclama "Bem-aventurados os pobres em espírito, pois deles é o reino dos Céus". E neste mesmo dia, diante da mesma assembléia de pequeninos da Terra, ele ensina a começar a oração chamando a Causa Primeira de todas as coisas de "Pai Nosso".

De lá para cá se passaram dois milênios e chegamos ao ponto em que estamos passando da adolescência para a maturidade. Começamos esta nova passagem possivelmente no Século das Luzes, em que a ciência se tornou a senhora das mentes e corações ocidentais, que a propagariam pelo restante das terras atingidas por suas embarcações de comércio e de guerra. Já estavamos nela - chegados os tempos anunciados por Jesus - quando os Espíritos mobilizaram-se para chamar a atenção do homem aos fenômenos mediúnicos e, com a diligência de Kardec, legaram a humanidade a Doutrina dos Espíritos.

E no século XX vivemos as crises desta passagem, em que a humanidade indecisa entre as ilusões da juventude e as obrigações da maturidade, lançou-se indecisa nos braços do materialismo, com a busca desenfreada do bem-estar material a qualquer preço.

Agora no XXI estamos diante do desafio de ir adiante. E para irmos adiante necessitamos nos libertar do fardo que o materialismo tem imposto a toda sociedade. O mundo material não é um fim por si mesmo, é apenas meio para o desenvolvimento das possibilidades do espírito, e a vida material é o instrumento didático por excelência. Somos alunos de uma mesma escola e a solidariedade deve sobrepor-se à competição e ao egoismo. Os problemas econômicos e sociais só tomaram o vulto que tem hoje porque foram erroneamente colocados em primeiro lugar sobre a dignidade do ser humano, sobre a possibilidade gigantesca que temos de encontrar soluções para os problemas mais difíceis, quando deixamos de lado os interesses mesquinhos e praticamos o "amar a Deus sobre todas as coisas e ao Próximo como a nós mesmos".

Viver bem, construir sociedades economicamente prósperas, progredir a ciência material, são bens inestimáveis, mas se voltam contra o próprio homem quando levados a seu extremo em detrimento das necessidades do espírito imortal. E nada representa melhor isso do que o homem contemporâneo saturado de produtos químicos necessários a manter seu organismo em funcionamento diante do stress de uma vida agitada, agitada devido a necessidade de se desdobrar para auferir os rendimentos necessários para custear uma infinidade de pequenos prazeres transitórios. E a cada prazer transitório conquistado, em vez da satisfação encontra o homem o desencanto e a frustação daquilo não durar mais. E outro exemplo é a juventude que se interna nos "barzinhos" da vida para consumir álcool sem moderação, quando não cai vítima das drogas.

E é este homem contemporâneo, ainda na fase de crises de final de juventude da humanidade, que recusando-se a reconhecer as limitações de seu modelo materialista de vida, quer avançar sobre os poucos terrenos ainda sagrados. Fala-se no aborto eugênico, na eutânasia "piedosa", na pena de morte e no suícidio assistido.

Tudo isto passará a medida que a humanidade amadurecer e o papel do Espiritismo é ajudar nesta transição. E nada mais eficaz do que mostrar de forma convincente a realidade da vida do espírito. E mostrar que toda esta caminhada da humanidade, desde os tempos pré-históricos mais longínquos, aos dias de hoje, segue uma grande linha mestra que é o desenvolvimento espiritual do homem. Do pensamento abstrato aos cultos primitivos, dos cultos primitivos às grandes religiões, das grandes religiões ao uso individual da razão, do uso individual da razão ao ser ético e espiritualizado do porvir.

Muita Paz,
Carlos Iglesia
Editor GEAE

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Artigos


Um Diálogo Fraterno sobre a Ciência & Espiritismo VII

(Continuação do Artigo iniciado no Boletim 476)

18) Há algo na física quântica ou na cosmologia que aponte para a existência de planos diferentes de existência?

[Ademir] Na física quântica não, pelo menos se a intepretação usual for adotada. Na cosmologia podem existir modelos de universo multidimentsionais que impliquem na existência de planos materiais "perpendiculares" (ortogonais) ao de nossa existência. Mas um cosmólogo pode ser levado a postular tal plano para adequar melhor o que se observa (desde que se dê devida atenção ao universo observável) ou por divertimento teórico, mas não porque acredite sinceramente que tais planos existam fora do escopo de sua atividade profissional.

[Alexandre] Nós espíritas acreditamos na existência do mundo espiritual coexistindo com o mundo material e interagindo com este constantemente. Mas quando a gente busca na física moderna alguma idéia que “favoreça” esse entendimento, as pessoas estão se esquecendo de que as propostas dos cientistas para os ditos “universos paralelos” trazem com elas detalhes que são estranhos e acabam por dar munição aos contraditores do Espiritismo prejudicando a sua divulgação. Por exemplo, na proposta de universos paralelos de Stephen Hawking, cada universo representaria um possível universo real contendo tudo o que o nosso Universo contém mas com alguma pequena alteração. Existiria o universo onde o Alexandre é um motorista de ônibus (um dos meus sonhos de criança) e onde o Alexandre é adepto de outra religião. Existe um outro universo que o Alexandre é mais alto ou mais gordo e por aí vai. Existem universos em que o Alexandre é físico e espírita mas optou por brigar com seu vizinho por causa de um problema enquanto que em nosso Universo o Alexandre não brigou. O que significam esses multiplos “Alexandres”? Com certeza o meu espírito anima o “Alexandre” deste Universo, mas existiriam outros espíritos animando os outros “Alexandres”? Como eu posso pensar que o que determina o que vai acontecer comigo (no exemplo anterior: brigar ou não com o vizinho) é regido por leis probabilísticas? Onde está o meu livre-arbítrio se a função de onda pode se manifestar de forma diferente a cada instante? Sinto falta de ver explicações detalhadas e consistentes para essas e outras questões.
 
19) O que são as tão propaladas "dimensões"?

[Ademir] Em matemática e na física uma dimensão é definida como um grau de liberdade de uma determinada coisa. Pode-se livremente falar, por exemplo, num espaço de 6 dimensões como descrevendo o espaço de fases de uma partícula ou "ensemble" de partículas em física estatística. Nesse caso, não se quer dizer que existam 6 "planos de existência" mas que a descrição do estado completo é feito apropriadamente com um vetor de 6 dimensões. Parece que o uso da palavra "dimensão" (assim como no caso de energia) pode evocar um significado diferente do específico dependendo do indivíduo que ouve. E isso pode levar a se pensar que muitos planos de existência existam a partir de reinterpretações das teorias da física. Insisto que esse não é o caso. Para a física terrena só existe um universo que é o nosso observável com três dimensões geométricas bem determinadas. O tempo é as vezes tratado como uma outra dimensão (como no caso das teorias relativísticas) mas isso por uma razão de "formalismo".

20) Tenho até receio de perguntar, mas vamos lá, o que é "espaço-tempo"?

[Ademir] Por uma razão de formalismo da relatividade, é conveniente tratar as três dimensões espaciais em conjunto com o tempo formando um vetor de quatro dimensões. Com isso as equações adquirem uma forma "bonitinha", isto é, ficam numa forma fechada como se, de fato, só existisse um espaço onde se aplicam as equações, o "espaço-tempo". O "espaço-tempo" é assim uma invenção do formalismo que simplifica as equações. Na hora de se "resolver" as equações - encontrar uma solução numérica - o tempo adquire um status especial, de parâmetro independente e ai o "continuum" se quebra.

[Alexandre] Como o Ademir disse, “espaço-tempo” é um esquema criado para simplificar e visualizar as propriedades das equações básicas da relatividade. Esse diagrama é bastante útil para compreender-se que tipos de eventos podem ocorrer e quais são os seus limites. 

21) Existe alguma teoria física atual que postule a existência de  multiplas realidades dentro do espaço-tempo?

[Ademir] Essa questão é semelhante à questão 18 aplicada ao "continuum" do espaço-tempo.

22) As teorias de Hernani Guimarães Andrade sobre o "Psi Quântico" e o "Modelo Organizador Biológico" encontram paralelos na física?

[Ademir] Não.

[Alexandre] O trabalho do prof. Hernani G. Andrade é muito interessante e constitui numa ampla fonte de informações. Porém as propostas dele não constituem uma teoria no sentido mais rigoroso desta palavra. Suas propostas são muito qualitativas e são passíveis de questionamento. Existe um artigo do prof. Dr. Carlos R. Appoloni em (http://www.neudelondrina.org.br/ , clicar no link para art. científico) onde ele faz uma crítica muito construtiva sobre o livro Psi Quântico. Inclusive o Dr. Hernani G. Andrade ficou muito satisfeito com esse artigo sobre o modelo que ele propôs. Em comunicação particular, poucos meses antes de desencarnar, o Dr. Hernani me disse que dois pesquisadores no Paraná, se não me engano, estão trabalhando com culturas de bactérias aplicando-se campos magnéticos compensados/anulados de acordo com o modelo que o Dr. Hernani propôs. Até agora nenhum resultado foi encontrado ou pelo menos ainda não tive ciência deles.

Eu fiz uma análise de alguns pontos (detalhes) da proposta do Dr. Hernani que me pareceram inconsistentes. Eu estou preparando um trabalho a ser publicado em breve comentando o assunto.

Mas isso não invalida o trabalho nem é falta de respeito com o Dr. Hernani. Os livros dele constituem leitura básica de extrema importância para quem deseja trabalhar nessas pesquisas. 

Como mencionei na questão 12, antes de se propor uma teoria para a estrutura da matéria Psi, devemos estudar e conhecer bem suas propriedades macroscópicas. Daí então, buscarmos teorias que expliquem essas propriedades em termos da estrutura. Senão, uma teoria destas ficará muito “no ar” sem ponto de apoio sólido onde se sustentar.

A maioria das perguntas tem girado em torno das relações entre física e espiritismo. Uma coisa importante que o fisico desenvolve na sua vida acadêmica é um forte senso crítico de seu trabalho. Nenhum trabalho científico foi “pra frente” sem análises extremamente críticas. Que fique claro que isso não é desrespeito com ninguém. Mesmo essas palavras que estão sendo lidas agora devem ser meditadas e não, simplesmente, aceitas só porque os autores delas são cientistas.

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História & Pesquisa

(Seção em parceria com a "Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas")

A Pesquisa Qualitativa Entre a Fenomenologia e o Empirismo-Formal III, Jáder dos Reis Sampaio, Brasil

(Continuação do Artigo iniciado no Boletim 480)

O Que é Fenomenologia?

ZILLES (1994) fez uma síntese da evolução dos conceitos de fenômeno em Filosofia, onde mostra haverem pelo menos dois sentidos marcantes: o primeiro, mais amplo, significaria “tudo o que aparece, se manifesta ou se revela” e está conectado a tudo o que existe exteriormente, ou seja, os fenômenos físicos. Kant, entretanto, notabilizou-se ao distinguir o fenômeno da coisa em si (que denominou “noumenon”). Para eles os fenômenos seriam os objetos da experiência, e as
“coisas em si” seriam “incognoscíveis e transcendentes à experiência”.

Edmund Husserl (1859-1938) irá construir a Fenomenologia como uma vertente crítica ao naturalismo vigente à sua época, que insistia em negar a subjetividade para estudar os fatos naturais como se fossem uma realidade única. Volta-se, portanto, ao mundo interior dos homens, chamado transcendental¹, onde ser fará a conexão possível entre as coisas em si e as idéias. Husserl privilegia, portanto, o estudo da consciência que define como uma instância psíquica que constitui
significações, seja ao apreender ou ao constituir os significados dos acontecimentos naturais ou psíquicos.

A consciência é entendida pela Fenomenologia de Husserl como sendo um “fluxo temporal de vivências”, peculiar, porque é imanente, ou seja, capaz de dar sentido às coisas e de apreender através da intuição aquilo que é universal, já que ela capta a multiplicidade de fatos e a sua essência comum. Outro aspecto importante da consciência diz respeito à sua “intencionalidade”. Chauí (1988) descreve a intencionalidade como “dirigir-se para, visar alguma coisa”, o que a torna uma atividade constituída de atos que visam a algo. “Toda consciência é uma consciência de algo.” Husserl denomina a estes atos, que podem ser perceptivos, imaginativos, especulativos, volitivos, etc., com o termo noesis, e aquilo a que visam com o termo noema. Os noemas estão presentes na consciência sem serem partes dela.

Husserl distingue ainda dois níveis de noesis; o nível empírico onde se identificam atos psicológicos e individuais para conhecer um significado independente deles, e o nível transcendental onde as noesis são atos do sujeito constituinte que cria os noemas enquanto idealidades puras ou significações.

“A fenomenologia husserliana pretende estudar, pois, não puramente o ser, nem puramente a representação ou aparência do ser, mas o ser tal como se apresenta no próprio fenômeno. E fenômeno é tudo aquilo de que podemos ter consciência, de qualquer modo que seja.” (ZILLES, 1994. p. 125)

Outro conceito importante para o entendimento da fenomenologia reside na dinâmica da relação entre o fato e a consciência. Como já afirmamos acima, Husserl trabalha com as intuições da consciência como sendo os elementos constituintes do conhecimento. Elas, entretanto, só constroem conhecimento à medida que são capazes de perceber as essências, distinguindo diferentes possibilidades de representação dos objetos.

“Dizemos que dois atos intuitivos possuem a mesma essência quando as suas intuições puras têm a mesma matéria. ...Todas as intuições objetivamente completas de uma mesma matéria têm a mesma essência.” (HUSSERL, 1988. p. 78)

Uma vez aceita a premissa husserliana se pergunta como fazer ciência, ou ainda, o que é ciência para a fenomenologia. O critério de verdade em Husserl (1988, p. 94) é definido como “a plena concordância entre o visado e o dado como tal”, ou, como interpreta Chauí, entre “o ato de conhecer e o seu correlato”. Isto não significa que a verdade seja apenas uma verdade subjetiva, no sentido de ser considerada apenas no recesso do pensamento de seu criador, mas reflete a ordem das coisas.

A questão a que esta afirmação nos remete é: como pode o agente do conhecimento distinguir as essências das coisas e não ser iludido pelas aparências da realidade exterior ou pelos conteúdos pré-existentes da sua consciência?

ZILLES e CHAUÍ identificam três condições propostas por Husserl para a fundamentação de uma ciência de rigor:

a) ausência de pressupostos: ou seja, o pesquisador evitaria considerar o que já foi dito por pensadores ou pela teoria, indo diretamente às coisas mesmas, buscar suas essências. A epoqué consiste “em nos abstermos por completo de julgar acerca das doutrinas de qualquer filosofia anterior e em levar a cabo todas as nossas descrições no âmbito desta abstenção”. (Husserl apud Zilles, 1994. p. 128)
b) o caráter a priori: que significa desconfiar dos dados empíricos para fundamentar-se em idealidades (“as coisas mesmas”) da consciência transcendental, a única capaz de captar as essências. Entende Husserl que a intuição da essência é diferente da percepção do fato. É fácil ilustrar este tipo de postulado quando se observam ações de pessoas, que estão revestidas de intencionalidades. A mera observação do resultado da ação ou da ação em curso não revela a intencionalidade do sujeito. O trabalhador que opera em ritmo lento pode estar protestando contra a fábrica, estar estressado, despido de conhecimento necessário para a realização de sua atividade, disperso, preocupado com problemas de casa, ou por uma infinidade de motivos.
c) evidência apodítica: seriam as bases das construções dos juízos (aos moldes do pensamento cartesiano). Seriam evidências “com ausência total de dúvida”, cuja obtenção se dá a partir das reduções fenomenológicas que Zilles descreve da seguinte forma:

“Para chegar ao fenômeno puro, Husserl suspende o juízo em relação à existência do mundo exterior (transcendente). Descreve apenas o mundo como se apresenta na consciência, ou seja, reduzido à consciência. Tal suspensão ou colocação entre parênteses chamou epoqué. Portanto, não duvida da existência do mundo, mas simplesmente o põe “entre parênteses” ou o idealiza ou o reduz ao fenômeno: a redução fenomenológica. No fenômeno, por sua vez, procede a sucessivas reduções em busca da essência: a redução eidética. Assim entende a fenomenologia como análise descritiva das vivências da consciência depuradas de seus elementos empíricos para descobrir e apreender as essências diretamente na intuição.” (ZILLES, 1994. p. 130-131)

Não é de fácil entendimento a delimitação da redução eidética como método. De Bruyne (1991) entende, a partir de Merleau Ponty, que se o pesquisador imaginar todas as relações implicadas por um fenômeno e o fizermos variar, pela imaginação, tudo o que não puder ser variado sem que o objeto desapareça é uma essência.

A Fenomenologia, apesar de se situar como uma ciência rigorosa, não se acha descrita metodologicamente de forma prescritiva, o que levou Martin Heiddegger, discípulo de Husserl a escrever uma frase que ficou famosa: “compreender a Fenomenologia é apreender suas possibilidades”. Como a fenomenologia fez escola, alguns dos seus pesquisadores realizaram esforços de apresentação compreensiva do método. Bruyn, por exemplo, fez uma releitura do trabalho de Spigelberg, onde se identificam sete “passos” do método fenomenológico, a saber:

                                        “1. Investigar fenômenos particulares
2. Investigar essências gerais
3. Apreender as relações essenciais entre as essências
4. Observar os modos de aparecimento
5. Observar a constituição dos fenômenos na consciência
6. Suspender a crença na existência do fenômeno
7. Interpretar o significado do fenômeno. (BRUYN, 1970. p. 284)

Miles e Huberman (1994) tecem outra consideração metodológica sobre o trabalho dos fenomenologistas. Eles afirmam que os pesquisadores desta orientação freqüentemente trabalham com transcrições de entrevistas e que são cuidadosos na condensação deste material. Evitar-se-ia o uso de codificação, mas trabalhar-se-ia fazendo releituras continuadas nas fontes primárias com cuidados para com suas próprias pressuposições para capturar-se a essência (o lebenswelt do informante). Podemos adicionar que os discípulos da fenomenologia empregam outros métodos que não a leitura de entrevistas transcritas, utilizando também a observação participante.

Parece-nos que a fenomenologia tem seu lugar nas ciências humanas e sociais e que a tentativa de empregá-la como método de análise de objetos próprios das ciências naturais é infrutífero, posto que eles se acham despidos de intencionalidade ou de consciência de si. Neste campo a aparência estaria mais “próxima” das essências; os determinismos são mais patentes e, por tal, os métodos empírico-formais são mais produtivos, já que se focalizam na identificação de regularidades e conseqüente construção teórica, seja pela via da indução, seja pela do método hipotético-dedutivo.

Miles e Huberman situam a fenomenologia, a semiótica, o desconstrutivismo estético, a etnometodologia e a hermenêutica em uma única categoria de linhas de metodologia de pesquisa, denominada interpretativismo. Eles consideram que apesar de suas diferentes ênfases e variações, há uma linha comum de ação e compreensão.

O Que é Pesquisa Qualitativa?

Um bom número de autores entende a pesquisa qualitativa como sendo uma pesquisa cujas variáveis não podem ser mensuradas a nível intervalar ou de razão. PARASURAMAN (1986), por exemplo, define-se nesta linha:

“Pesquisa qualitativa envolve coletar, analisar e interpretar dados que não podem ser significativamente quantificados, isto é, sumarizados em forma de números. Por esta razão a pesquisa qualitativa é algumas vezes considerada como uma pesquisa soft.” (PARASURAMAN, 1986. p. 240)

Sampson leva esta concepção às suas conseqüências:

“A pesquisa qualitativa é usualmente exploratória ou diagnóstica. Ela envolve um número pequeno de pessoas que não estão amostradas em uma base probabilística. Elas podem, contudo, serem selecionadas para representar diferentes categorias de pessoas de um mercado-alvo ou segmento da comunidade. Em pesquisa qualitativa nenhuma tentativa é feita para obter conclusões rápidas e sólidas (hard)” (SAMPSON, 1991. p. 29)

Estas visões estão associadas à concepção empírico-formal de ciência. Outros autores defendem uma definição um tanto diferente de pesquisa qualitativa.

Kirk e Miller ampliam o conceito de pesquisa qualitativa dizendo que ele pode ser visto a partir de duas óticas: a ótica da “oposição à quantidade” e a da tradição das ciências sociais que “fundamentalmente dependem da observação de pessoas em seu próprio território e interagindo com elas em sua própria linguagem, em seus próprios termos”. Eles consideram a primeira definição limitada e se posicionam da seguinte forma:

“A partir da nossa visão pragmática, a pesquisa qualitativa implica em um comprometimento com atividades de campo. Não implica em um comprometimento com a “inumeração”. A pesquisa qualitativa é um fenômeno empírico, socialmente localizado, definido pela sua própria história, não apenas um “saco de gatos” que compreende todas as coisas que não são quantitativas.” (KIRK e MILLER, 1988. p. 10)

Eles adotam uma posição epistemológica interessante. Se por um lado não crêem que o mundo externo determina absolutamente a única e correta forma visão que se pode ter dele (positivismo) pelo outro lado criticam a posição oposta e extrema de que é possível encontrar explicações alternativas para tudo e com isto desistir de fazer qualquer esforço de escolha entre elas (relativismo). Recordam-nos de que há um outro lado da objetividade: a de que o mundo externo existe, apesar de tudo (realismo).

Posição semelhante é a de Miles e Huberman (1994) que se definem como “realistas transcendentais” por acreditarem que o fenômeno social não existe apenas na mente, mas também no mundo objetivo e que algumas relações estáveis podem ser encontradas entre eles.

Glazer e Strauss (1970) criticam a concepção empirista-formal da teoria científica, como a concepção de Sampson apresentada acima, e defendem que a pesquisa qualitativa não é uma preliminar da pesquisa quantitativa, mas que pode ser a base da formulação e descoberta de “teoria substantiva”. Os métodos clínicos têm sido a base de inúmeras teorias em Psicologia. A psicanálise e a epistemologia genética de Jean Piaget são exemplos de teorias que se tornaram globalmente difundidas. Nas ciências sociais, a etnometodologia e o interacionismo simbólico têm sido construídos a partir dos métodos qualitativos, quase que exclusivamente.

Em um outro extremo temos a definição de um cientista social, Cicourel (1969), que seria considerado relativista por Miles e Huberman, já que ele considera semelhantes o dogma religioso e a ciência, considerando-os ao mesmo tempo como corpos de conhecimento e ideologias, já que ambos possuem “seus próprios pressupostos teóricos, métodos e regras para admitir proposições para o seu respectivo corpo de conhecimento”. Ele entende que “o mundo dos “observáveis” não está simplesmente “lá fora” para ser descrito e medido com os sistemas de mensuração da ciência moderna, mas o curso dos eventos históricos e das ideologias de uma dada era pode influenciar o que está “lá fora” e como estes objetos e eventos devem ser percebidos, avaliados, descritos e medidos”. (CICOUREL, 1969. p. 38). Com base nesta perspectiva, ele evita a análise de métodos pela via da distinção entre sistemas científicos e metafísicos, ou se representam ideologias particulares, mas considera-os todos como meios de obter conhecimento sobre o mundo social.

Ely et al. (1996) também definem a pesquisa qualitativa de uma perspectiva diferente, que não pode ser considerada relativista como a de Cicourel, mas fenomenológica. Estas autoras consideram pouco compreensivo definir o termo “pesquisa qualitativa”, sendo melhor analisar características comuns de seus métodos. Elas identificam cinco características que consideram comuns a todo tipo de pesquisa qualitativa:

“1. Os eventos só podem ser entendidos adequadamente se eles são vistos no contexto. Por isto, o pesquisador qualitativo imerge-se no “setting”.
2. Os contextos de questionamento não são planejados, eles são naturais. Nada é predefinido ou suposto.
3. Os pesquisadores qualitativos querem que aqueles que são estudados falem por si mesmos, para que forneçam suas perspectivas em palavras e outras ações.  Conseqüentemente, a pesquisa qualitativa é um processo interativo no qual as pessoas estudadas ensinam ao pesquisador sobre suas vidas.
4. Os pesquisadores qualitativos presenciam a experiência como um todo, não como variáveis separadas. O objetivo da pesquisa qualitativa é compreender a experiência de forma global².
5. Os métodos qualitativos são apropriados às afirmações acima. Não há um método geral.
6. Para muitos pesquisadores qualitativos, o processo em seu curso fornece uma avaliação do que foi estudado”. (ELY et al., 1996. p. 4)

As autoras sintetizam bem em seu texto as diretrizes interpretacionistas para a pesquisa qualitativa, mas certamente não compreendem com elas o tipo de investigação realizado por cientistas como Parasuraman. Isto nos conduz às considerações finais deste despretensioso trabalho.

¹ ZILLES (1994) mostra a distinção que o pensador austríaco faz entre o transcendental e o transcendente. Enquanto o primeiro é fruto da consciência, o último termo é empregado referindo-se ao mundo exterior.

² “..to understand experience as unified.”

Artigo publicado originalmente na Revista de Administração da Universidade de São Paulo

[SAMPAIO, Jáder dos Reis. A pesquisa qualitativa entre a fenomenologia e o empirismo formal.
Revista de Administração. São Paulo, v. 36, n. 2, p.16-24, abr/jun 2001.]

Continua no próximo Boletim
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Questões e Comentários


Questões Intrincadas sobre o Espiritismo V

(Continuação do Artigo iniciado no Boletim 478)


6) Se alguém nasce pobre, isso pode ser uma desvantagem, mas dentro da justiça de Deus essa pessoa não poderia ter alguma vantagem que compensasse esse problema? E o mesmo não poderia acontecer com o rico? O próprio Jesus não disse que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico alcançar o reino dos céus? Se o ser humano pudesse avaliar um ser humano por completo, ele não enxergaria a justiça divina, sem precisar recorrer a explicações passadas?

Parece que você não está sendo coerente, pois acabou de dizer que não somos capazes de avaliar a justiça de Deus e agora vem estabelecendo parâmetro dentro da justiça de Deus. Mas, como já dissemos, a simples observação da vida das pessoas não nos permite saber se estão neste ou naquele momento em prova ou expiação. As dificuldades podem nos fazer agradecer a Deus ou imprecar contra Ele, dependendo de nosso estágio evolutivo. Voltamos a afirmar que não sabemos de explicação melhor e mais completa que a que nos fornece a Reencarnação, a Evolução e a Causalidade. Essas três leis precisam ser entendidas com profundidade. Não se trata apenas de aceitar existências passadas.

A Psiquiatria identifica indivíduos com idiotia, cujo significado é: “atraso intelectual profundo, caracterizado por ausência de linguagem e nível mental inferior ao da idade normal de três anos, e muitas vezes acompanhado de malformações físicas”. Daí lhe perguntamos: se a vida é única, qual a utilidade da vida para um Espírito com um nível mental inferior? Ele, ao morrer, não poderá ir para o “Céu” porque não fez o bem para o merecê-lo, mas também o “Inferno” não pode ser o seu destino, já que nenhum mal praticou? E aí, como explicar esse paradoxo? Estarão, todos os “desafortunados” que nascem com idiotia, destinados ao “purgatório” para toda a eternidade?

A interpretação que você propõe está em desacordo com a Justiça humana, quanto mais com a Divina. A Justiça manda que todos tenham chances iguais e oportunidades iguais. Dar vantagens a quem sofre mais e desvantagens a quem sofre menos parece ser justo mas não é. Há ricos que desejariam ter nascido pobres e vice-versa. Como avaliar os méritos de alguém se as condições são diferentes. Se é difícil a um rico entrar no reino dos céus, então devemos concluir que Deus criou uma armadilha para aqueles que nascessem ricos? O rico que conseguisse entrar no reino dos céus teria muito mais mérito do que o pobre que também foi para o reino dos céus, pois para o rico isso foi mais difícil. Portanto, sua interpretação está em contradição com a razão.

A interpretação espírita para essas palavras de Jesus é muito mais racional e demonstra a grande sabedoria e a bondade do Criador. Jesus quis dizer que o rico possui mais dificuldades de praticar o bem ao próximo porque a riqueza excita vícios e paixões que desviam as pessoas do objetivo maior da vida. A riqueza é, portanto, uma provação das mais difíceis. Mas se um Espírito falhar, ele poderá nascer de novo para reparar seus erros, aprender a dar valor passando por dificuldades financeiras, etc.

Continua no próximo Boletim

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Painel

 

Relato do III ENLIHPE, Jader Sampaio, Brasil

Encontro

Cerca de 80 pessoas passaram a tarde de sábado e a manhã de domingo na Associação Espírita Célia Xavier em Belo Horizonte - MG, estudando e discutindo a preservação da memória e a pesquisa espírita. Eles vieram de nove cidades diferentes dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. O público foi composto de lideranças espíritas, historiadores e outros profissionais, com formação superior ou de pós-graduação, assim como trabalhadores espíritas.

O III Encontro Nacional da LIHPE foi composto de dois simpósios, apresentados oito trabalhos e discutidos quatro projetos institucionais relacionados à cultura e memória, além do lançamento de livros e da apresentação da peça teatral “As Mesas Girantes”.

Segue uma sinopse dos principais trabalhos:

Seminário de História e Memória

    • Miriam Hermeto (professora universitária, historiadora e mestre em educação) tratou de teoria e metodologia de pesquisa histórica, desenvolvendo assuntos como características do ofício de historiador, trabalho com as fontes históricas, biografia x história de vida e preservação do patrimônio cultural no movimento espírita.
    • No debate dos projetos no dia seguinte, ela informou que há muitos recursos financeiros disponíveis para projetos de cunho cultural no Brasil, seja administrados pelo Estado nos seus três níveis, seja sob a forma de incentivo fiscal para pessoas jurídicas e físicas, mas o movimento espírita vem tendo uma ação tímida, em suas diversas esferas, na preparação e submissão de projetos culturais.
    • Jáder Sampaio (Professor da UFMG, Psicólogo, Doutor em Administração) chamou a atenção para o fato de os livros espíritas agora estarem sendo repassados às livrarias por distribuidoras, e que, mais que há trinta anos atrás, a lógica de mercado tem chegado ao centro espírita. Ele sugere que os centros espíritas tenham especial atenção sobre os títulos que comercializam, para que não se tornem meras livrarias de mercado, vendendo apenas lançamentos e romances procurados pelo público e se esquecendo que têm um papel importante na divulgação do Espiritismo.

    • Ele tratou de bibliotecas espíritas e destacou o cuidado que este órgão deve ter com seu acervo. Seu papel não se resume a emprestar livros muito procurados pelo público, mas ser um centro de referência, onde o estudioso possa fazer pesquisas e se possa ter um acervo compreensivo das obras espíritas.

    • Alexandre Rocha (editor das Publicações Lachâtre, bacharel em letras e especialista em administração) complementou a questão das bibliotecas dizendo ser prática comum o pedido de doação livros para editoras espíritas. Ele sugere que as bibliotecas possuam uma política de aquisição de acervo, buscando recursos para tal, o que viabilizaria a publicação de inúmeras obras importantes para o Espiritismo que não saem a público pela falta de interesse. Em frase de efeito, Alexandre informou ao público que a única biblioteca que adquire os livros históricos da Lachâtre sistematicamente é a biblioteca de Washington.

Seminário de Pesquisa

    • Alexandre Fonseca (Doutor em Física) e Jáder Sampaio responderam a um bloco de perguntas sobre o conhecimento científico, que mostraram que existem diferentes metodologias de pesquisa para as ciências humanas e naturais. O conhecimento científico não se fundamenta apenas em experimentos cruciais, mas na aceitação das teorias e idéias pela comunidade de cientistas de uma determinada área. Isso coloca à pesquisa de temas de interesse do Espiritismo a obrigação de buscar interlocução com a comunidade científica.

    • Os dois expositores afirmaram que muitos conceitos de suas áreas de atuação, Física e Psicologia respectivamente, vêm sendo utilizada de forma equivocada e sem fundamentação em textos publicados por autores espíritas. Essa situação demanda uma interlocução maior com os especialistas das diversas áreas que atuam no movimento espírita e um cuidado maior dos órgãos de divulgação e dos autores com a redação e publicação dos textos.

    • Foram apresentados os conteúdos de muitas teses e dissertações publicadas recentemente e que são do interesse do movimento espírita, mas as áreas de conhecimento predominantes ainda são as ciências humanas e sociais e os estudos se referem, em sua maioria, ao Espiritismo como um movimento religioso.

    • Foram propostas muitas idéias para o fomento da pesquisa de temas espíritas no ambiente universitário, como a construção de redes de pesquisadores espíritas das diversas áreas já atuantes nas universidades, o fomento da pesquisa através de bolsas de pós-graduação a serem oferecidas por instituições espíritas, aos moldes do que faz a Society for Psychical Research inglesa, o intercâmbio com pesquisadores de parapsicologia que estejam desenvolvendo temas de interesse do Espiritismo no Brasil e no exterior, a criação de bancos de teses e dissertações nos órgãos de cultura e memória espírita, a criação de espaços especializados na mídia espírita e o compromisso dos dirigentes das casas espíritas em inserir temas de divulgação desses trabalhos em uma linguagem compreensível ao grande público.

Apresentação de Trabalhos Inscritos

    • Alexandre Rocha mostrou-nos em seu trabalho que Clóvis Ramos, cuja desencarnação passou quase em branco pelo movimento espírita, nos deixou um acervo de quase 400 livros escritos, a grande maioria deles não publicados. Ele está levantando esse acervo e já localizou cerca de 200 títulos (153 inéditos e 47 publicados). Alexandre também tratou da vida de L. Palhano Jr., escritor e pesquisador espírita.

    • Com base na informação acima, ele propôs que os centros de documentação e as bibliotecas espíritas criassem um espaço para o depósito de originais que ainda não tiveram publicações, com fornecimento de um registro para assegurar os direitos autorais, aos moldes do escritório de direitos autorais da Biblioteca Nacional.

    • Paulo Henrique (editor da revista Universo Espírita) apresentou um trabalho no qual denuncia que a grande maioria de fontes e informações que temos disponíveis sobre Mesmer está incorreta ou imprecisa e que se fundamentaram nas obras de seus críticos. Ele realizou um trabalho de fôlego de obtenção e tradução dos livros desse autor e em breve o movimento espírita poderá ter acesso a eles. A imagem difundida do homem da casaca lilás (dourada em outras versões) com uma varinha nas mãos, tocando aos pacientes para transmitir o magnetismo animal é, portanto, uma criação de seus inimigos.

    • Milton Piedade (coordenador da LIHPE) apresentou um trabalho no qual ele discute o conteúdo das mensagens atribuídas a Allan Kardec, ditadas a Zilda Gama, que foram publicadas no livro Diário dos Invisíveis, publicado em 1920. No seu trabalho ele faz uma biografia da médium e descreve os diversos cuidados e preocupações de Zilda na identificação do espírito. Este trabalho faz parte de um projeto maior no qual o autor vem estudando as mensagens atribuídas a Kardec obtidas por diversos médiuns conhecidos pelo movimento espírita. Esse trabalho suscitou uma viva discussão sobre a necessidade de se conhecer mais o processo de construção do texto mediúnico, sobre a análise comparativa da linguagem do texto mediúnico de autores conhecidos e sobre os processos psiconeurológicos da psicografia.

    • Eduardo Carvalho Monteiro (escritor, coordenador da LIHPE, assessor pró-memória da USE-SP) apresentou suas pesquisas e as próximas publicações que estão em andamento.

    • Jomar T Gontijo (engenheiro eletrônico e especialista em Ética) membro do Grupo de Estudos de Ética apresentou um trabalho sobre ética espírita, no qual ele distingue ética de moral, apresenta as diversas influências que a ética recebeu no ocidente: Aristóteles, Jesus da Galiléia, Immanuel Kant, Jeremy Bentham e Jurgën Habermas. Ele propõe que se reavalie o jargão que diz que “a ética espírita é a ética cristã”, para que não se venha a confundir o cristianismo histórico com o Espiritismo. Ele defende que a ética espírita é cognitivista, empírico-racionalista, deôntica-teleológica, transdiscursiva, naturalista-evolucionária e universal.

    • Gil Restani de Andrade (administrador, diretor do Instituto de Cultura Espírita de Minas Gerais) recuperou com detalhes o episódio em que aconteceram raps no escritório do Sr. Allan Kardec, fazendo-o rever conceitos que estavam sendo desenvolvidos.

    • O Dr. Alexandre Fontes da Fonseca apresentou o trabalho controle do caos e influência dos espíritos na natureza no qual mostra, com base na teoria do caos, como a ação dos espíritos nos fenômenos naturais, especialmente em um fenômeno de grande porte como uma tempestade, poderia ser explicada.

    • Thelma Virgínia Rodrigues (engenheira elétrica e mestre em engenharia) mostrou as consistências entre idéias de “O Livro dos Espíritos” e as concepções contemporâneas dos estudos de “Ciência, Tecnologia e Sociedade - CTS”.

Comunicações de Projetos e Realizações Institucionais

    • Alexandre Zaghetto (representante da Federação Espírita Brasileira) apresentou os principais cuidados que estão em curso para a preservação e digitalização da biblioteca de obras raras. Ele respondeu a muitas perguntas do público.

    • Paulo Sérgio Manhães Peixoto (representante do Conselho Espírita de Unificação de Niterói) apresentou com detalhes as diversas atividades do Primeiro Mês de Cultura Espírita de Niterói. Inauguração da praça Professor Rivail em Piratininga, instituição e comemoração do Dia do Livro Espírita a partir de lei na Câmara Municipal de Niterói, monumento, placas comemorativas, lançamento de selos comemorativo, realização da exposição de “banners” das fotografias de “Allan Kardec” feitas por Edson Audi, peças teatrais, conferências, feira de livro espírita, lançamento do livro “Para Entender Allan Kardec” e cine-debates foram algumas das principais realizadas junto à população da antiga capital do estado do Rio de Janeiro.

    • Felipe Estabile Moraes (historiador, especialista em História e Diretor do Departamento de Assuntos de Unificação da União Espírita Mineira) apresentou as ações realizadas por essa instituição na preservação da memória, o que inclui a publicação de livros e a recuperação dos seus arquivos. Ele apontou a necessidade do desenvolvimento de um projeto mais substancial, recordando a todos que essa instituição se tornará centenária em 2008.

    • Eduardo Carvalho Monteiro e Paulo Henrique apresentaram com detalhes o seu projeto de um Centro Cultural e de Documentação do Espiritismo. Ele prevê a construção de três tipos de bibliotecas: uma biblioteca especializada espírita, uma biblioteca de obras raras e uma biblioteca de monografias. Prevê também um centro de documentação histórica, um museu da imagem e do som, um centro de mídia e um centro de cultura, pesquisa e projetos, no qual se fará, entre outras coisas, exposições de obras e ambientes culturais. Já foi doado um pequeno prédio na cidade de São Paulo no qual funcionará este Centro. Os autores estão viajando pelos estados buscando a adesão de companheiros espíritas para se criar uma rede articulada de Centros de Documentação. Sua ida ao estado do Rio de Janeiro já deu frutos positivos.

As Mesas Girantes

A Companhia Espírita Laboro (http://www.arteespirita.com.br) apresentou sua bem humorada peça “As mesas girantes”. A trama focaliza cinco situações: a família Fox, o quacker norte-americano Issac Post, a Sra. Hayden, o episódio de Kardec com Fortier e o drama fictício da Madame Gerard. Os esquetes combinaram precisão de dados e informações históricas com uma linguagem corporal de “arte clown”, canções com arranjos vocais e instrumentos musicais. O resultado é um espetáculo leve, emocionante, que instrui e diverte e que arrancou minutos de aplausos dos participantes, que se puseram de pé. A peça encantou a todos, que saíram refeitos após um dia de trabalhos intelectuais pesados. A companhia ofereceu o seu espetáculo ao evento gratuitamente, mostrando que é possível realizar divulgação do pensamento espírita através da arte e da criatividade.

Lançamento de Livros

Foram lançados os livros “História da Radiodifusão Espírita”, de Eduardo Carvalho Monteiro, Bezerra de Menezes, o 13o. Apóstolo, de Jorge Damas Martins (que não pode estar presente), “Dr. March em dois Planos” de Alexandre Machado Rocha e o “Aspecto Científico do Sobrenatural” de Alfred Russel Wallace, traduzido por Jáder Sampaio.

Homenagem a Napoleão Araújo

A mesa de abertura homenageou a Napoleão Araújo, membro da LIHPE que desencarnou em novembro de 2003. Napoleão foi presidente, vice-presidente e conselheiro da Federação Espírita do Estado do Paraná, participava ativamente das trocas de informações na LIHPE e divulgava alguns dos trabalhos através da homepage da FEP.

Síntese das Conclusões do III ENLIHPE

  1. O movimento espírita necessita se perceber como tendo uma identidade cultural própria e não apenas como um movimento religioso.

  2. O movimento espírita deveria elaborar e encaminhar projetos culturais, viabilizando-os com fundos públicos e incentivos fiscais.

  3. Os órgãos federativos devem formar grupos de trabalho em suas respectivas esferas (municipal, estadual e federal) para identificar e orientar centros espíritas sobre a legislação e a utilização incentivos próprios à cultura.

  4. O movimento espírita deve construir Centros de Cultura e Documentação regionais, a serem articulados entre si, com a finalidade de colecionar, preservar e divulgar fontes históricas (documentos, livros, imagens, jornais, etc.) regionais. Estes centros viabilizarão a pesquisa histórica do movimento espírita brasileiro no futuro.

  5. Devemos empreender esforços no sentido de recuperar e preservar a obra de autores e personalidades consideradas importantes para o movimento espírita, sob a pena das gerações futuras terem dificuldades ou não terem como consultar esses livros e documentos e passarem a entender o passado a partir de narrativas ou lendas.

  6. As sociedades espíritas devem ter uma política clara para que suas livrarias sejam efetivamente espaços de divulgação da doutrina espírita e suas bibliotecas venham a construir um acervo de obras para a realização de estudos por parte dos interessados.

  7. Dever-se-ia empreender um esforço para o fomento, intercâmbio e divulgação da pesquisa científica de temas do interesse do movimento espírita e da articulação dos pesquisadores espíritas ou simpatizantes já atuantes nas universidades em linhas de pesquisa ou redes de intercâmbio.

Instituições que apoiaram a realização do evento

  • Associação Espírita Célia Xavier - AECX
  • Conselho Espírita de Unificação do Município de Niterói - CEUNIT
  • Editora Madras Espírita
  • Federação Espírita Brasileira - FEB
  • Grupo de Estudos Avançados Espíritas - GEAE
  • Grupo Educação, Ética e Cidadania - GEEC
  • Jornal Correio Fraterno do ABC
  • Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas – LIHPE
  • Livraria “Ysnard Machado Ennes”
  • Livraria e Editora da União Espírita Mineira
  • Publicações Lachâtre
  • Revista “Universo Espírita”
  • Site Panorama Espírita
  • Site Terra Espiritual
  • União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo – USE-SP
  • União Espírita Mineira - UEM

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IV Congresso Espírita Mundial ao vivo pela Internet, Luis Hu Rivas, Brasil

A Comissão Organizadora do IV Congresso Espírita Mundial está trabalhando para possibilitar a transmissão ao vivo pela Internet dos trabalhos do IV Congresso Espírita Mundial, que será realizado em Paris nos dias 2 a 5 de outubro próximo.

Para acompanhar o Congresso será necessário instalar o programa Paltalk (http://www.spiritist.org/paltalk.htm) e acessar a sala "Kardec" na categoria "Spanish-Portuguese". É interessante fazer a instalação com alguma antecedência, devido aos ajustes necessários na configuração do som.

Maiores detalhes podem ser encontrados na página do Conselho Espírita Internacional - http://www.spiritist.org/

Congresso

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GRUPO DE ESTUDOS AVANÇADOS ESPÍRITAS

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